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Da hipocrisia

por Luís Naves, em 08.01.16

Por dá-cá-aquela-palha surgem violentas indignações, mas as conversas são sempre sobre trivialidades, clubes de futebol e assuntos fracturantes que interessam a meia dúzia. Vivemos num período de profunda hipocrisia. A política esconde-se atrás de uma retórica balofa, de dedo espetado, a qual jura que se bate por grandes causas. Os intelectuais deixaram de dizer o que pensam. Os banqueiros e empresários servem interesses instalados. Valores, tradições, passado, nação são palavras que deixaram de ser utilizadas, até vagamente sujas. Entre os intelectuais, não há carreiras sem exposição mediática e esta depende das afirmações justas. Nos jornais, publica-se sobretudo o irrelevante e o incontroverso. A popularidade exige comportamento domesticado e quem não seguir as regras será invisível. A língua de pau exprime sobretudo o vazio. Os partidos afundam-se num pântano de falta de ideias e a opinião pública está infantilizada, o seu voto ignorado em nome das ilusões delirantes, dizendo-se que é mudança aquilo que visa repor o que antes falhara. As elites empresariais são uma face do poder partidário e dos interesses especiais sentados à mesa do orçamento, que perfaz metade da economia. Ali ganham sempre os grandes. O cidadão comum, esse, vive na incerteza e na insegurança. Paga mais impostos e tem menos serviços públicos, as dívidas acumulam-se, o desemprego é altíssimo. Ouve sempre a mesma lengalenga: que os males do mundo são culpa sua, por causa do imperialismo, do colonialismo, da escravatura, do consumo e do alheamento. O falhanço das elites nacionais devia produzir-nos espanto, mas causa apenas encolher de ombros. As pessoas desligam, vão às suas vidas, mas existe uma inquietação nesta aparente indiferença, fermenta ali também o cansaço e a raiva.

publicado às 12:16



Autores

João Villalobos e Luís Naves