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Um enigma

por Luís Naves, em 13.01.18

Muitas das inovações sociais dos últimos cem anos têm sido sobretudo americanas e, de repente, toda a gente desatou a discutir as peripécias de uma campanha nascida nos Estados Unidos contra o assédio sexual dos poderosos. A campanha nasceu em Hollywood e está a espalhar-se na política e nas artes, com momentos de MacCarthismo e caça às bruxas, outros que dão que pensar. Entre nós, obviamente, só se discute o mau-carácter dos actores de Hollywood apanhados na rede, porque em Portugal nunca houve assédio sexual dos poderosos e os maus exemplos limitam-se à técnica do piropo na construção civil. O tema é pertinente, mas na ausência de prevaricadores nativos e com base nos americanos, a esquerda puritana quer transformar o debate numa teoria de guerra entre os sexos (já agora, como estamos a destruir a pátria, a religião, a família, a arte e todas as restantes tradições, enfim, vamos também proibir a sedução e o sexo). Esta tentativa reaccionária de criar um arquipélago conventual de carmelitas e monges capuchinhos exclui todas as tentativas de ser razoável, como aconteceu nas críticas que choveram imediatamente a uma carta moderada de cem mulheres francesas, alertando para as consequências do exagero desta campanha e para as nuances puritanas que a alimentam. É sem dúvida um dos grandes enigmas nestes nossos tempos falsos: a esquerda ortodoxa está cada vez mais reaccionária e assumiu as principais lutas do conservadorismo.

publicado às 11:29


Autores

João Villalobos e Luís Naves