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Quem conduz o processo?

por Luís Naves, em 20.09.16

Este texto de Wolfgang Munchau no Financial Times, traduzido para português no DN, tem muita matéria para reflexão. Quando o autor menciona os países mais atingidos pela redução de rendimentos na crise, esquece-se de Portugal, quando fala do crédito malparado esquece-se de Portugal, quando escreve sobre as más lideranças esquece-se de Portugal. Esta é uma visão alemã da Europa, uma visão crítica, é certo, mas sobretudo alemã, pois exclui tudo o que é pequeno e menor.

“O grau de integração já não é determinado por aquilo em que se acredita, mas por aquilo de que se precisa”, escreve o autor. Os líderes fracassaram em toda a linha e é feito um elenco impressionante de erros que mais não foram do que reacções atrasadas a eventos que deviam ter tido outra resposta; e, no entanto, apesar de reconhecer o fracasso, Munchau olha para a discussão de Bratislava sobre o futuro da Europa como mera distracção do essencial, não como ciclópica confirmação do alheamento e cegueira que atingiu estas velhas lideranças europeias, todas em transição e de mãos atadas.

O artigo é pessimista e o autor considera que os protestos dos eleitores europeus têm origem nas dificuldades económicas, o que está longe de ser evidente. A propósito do Brexit, e como consequência, referindo-se ao futuro da Europa, Munchau conclui que “agora, são os eleitores que conduzem o processo”, quando o Brexit pode ser interpretado como manifestação do inverso: os eleitores não andam a conduzir coisa alguma, muito menos o processo de integração, por isso votaram contra algo que julgavam não controlar, esta forma de integração europeia.

Para onde vai a Europa? Este inteligente artigo sugere que a UE vai na direcção de novas crises financeiras, com os bancos alemães carregados de produtos tóxicos, os italianos de crédito malparado, alguns países sem crescimento suficiente, outros afectados pelas taxas de juro negativas. A zona euro desmorona-se, mas não há partidos de poder a dizerem o que pode ser feito, que nos expliquem o que é isso de mais integração e que consequências terá para os trabalhadores comuns e, sobretudo, para a autonomia dos pequenos países. Haverá mais integração? É o mais certo, mas está longe de ser claro o que é que isso implica para eleitores que, sendo afectados pelas decisões da Alemanha, não participam nas respectivas escolhas políticas. O mesmo é válido em sentido contrário: acham que algum contribuinte alemão aceitará pagar, por intermédio de eurobonds, dívidas contraídas por um governo português refém de infantilidades trotskistas? Tirem o cavalinho da chuva. As crises implicam menos liberdade para governos nacionais e os seus arranjos internos. Um dia, acordamos com governos tecnocráticos, sem margem de manobra, seremos uma simples região pobre de uma Europa rica.

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publicado às 11:45


Autores

João Villalobos e Luís Naves