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Pedaços do mundo e grãos de areia
Há quem se questione se vale a pena ler livros novos. A questão pode ser colocada com superioridade intelectual ou com um pouco mais de graça, baseando-se na observação de que não teremos tempo para ler tudo ao longo da vida, pelo que a leitura é uma escolha sempre difícil. Para cada livro lido, existe um livro perdido, pois o tempo foge, e vemos estes intelectuais cheios de angústia, chegando ao fim do caminho a preencherem a lista dos livros lidos e faltando lá, para sua vergonha, certo clássico famoso.
Enquanto cresce a montanha do que nunca leremos, o céptico julga a vida desperdiçada, mas afinal ele é a soma das suas memórias, incluindo as falsas, a soma das suas experiências e também das suas leituras. De certa maneira, somos o que lemos e o que conseguimos reflectir sem ajuda. Sendo cada um de nós também o que leu, planear a leitura excluindo o que é recente corresponde a premeditar a vida, como se soubéssemos de antemão que determinado livro é melhor para nós do que aquele outro desconhecido e novo, que iremos assim ignorar.
Não existe apenas literatura boa e literatura má, a situação é mais complexa: existem livros que nos tocam, que nos transformam, que nos dizem alguma coisa, e livros que pouco mexem connosco, que não conseguem quebrar as barreiras do tempo e da língua. À partida, não sabemos o que nos fará cada uma dessas obras. Se ninguém ler livros novos, não haverá livros novos, mas apenas vidas programadas, que não deixando nada ao acaso, vão simplesmente descobrir o que os outros já descobriram antes.