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Telegrama

por Luís Naves, em 11.11.14

Agora, são mais as vezes em que me envergonho um pouco do que escrevo, em que me parece tudo desagradável e fútil, insuficiente e mal concebido. A escrita precisa de ser autêntica, com acabamentos finos e devidamente trabalhados, mas as frases saem-me toscas e pobres, demasiado banais, incompletas e ocas. A cabeça anda-me perdida em pensamentos, dispersa numa melancolia improdutiva e vaga. As memórias apagam-se e aquilo que vivi parece tão distante como a Lua. Devia escrever sobre isso, a realidade tal como a senti, e ando a escrever sobre a irrealidade que imagino. Devia escrever sobre a insensatez, mas produzo textos cartesianos, como se o mundo fosse a regra e esquadro, sem o caos à solta. Devia escrever sobre a verdade e escrevo sobre a mentira. Vivemos, sem dúvida, em tempos irreais, era isso que eu queria dizer, mas bastava dizer isso mesmo, que nada do que vemos é verdadeiro, que o autêntico não existe, não passando de uma elaborada manipulação dos sentidos. Como dizia um famoso produtor de Hollywood ao criticar os seus argumentistas: ‘querem enviar mensagens? mandem um telegrama’.

publicado às 22:38


2 comentários

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De Um Jeito Manso a 11.11.2014 às 23:40

Não tem razão para se envergonhar. Posso muitas vezes não concordar consigo mas reconheço a qualidade do que escreve. Pode andar desiludido e terá razões para isso, ou pode ter dificuldade em encontrar as linhas onde a escrita costumava assentar mas as suas palavras valem por si, com ou sem linhas, no meio do caos ou do vazio, com ou sem melancolia. Continue, de preferência escrevendo mais do que telegramas. Os tempos sombrios precisam de alguma luz mesmo que apenas aquela que se esconde dentro das palavras.
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De Luís Naves a 12.11.2014 às 09:06

Agradeço muito este amável comentário

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Autores

João Villalobos e Luís Naves